As fibras na alimentação moderna: redefinindo a nutrição com apelo saudável e sensorialidade

De tecnologias que aprimoram textura e estabilidade a soluções que impulsionam a funcionalidade digestiva e metabólica, as fibras se consolidam como ingredientes multifuncionais e altamente adaptáveis às novas demandas do mercado.
Por Márcia Fani
A alimentação contemporânea atravessa uma revolução silenciosa. Em meio a transformações culturais, avanços tecnológicos e descobertas científicas, o que comemos, e como comemos, deixou de ser apenas uma questão de nutrição para se tornar reflexo de um estilo de vida, de escolhas conscientes e, cada vez mais, de posicionamentos saudáveis.
Hoje, o consumidor busca alimentos e bebidas que entreguem prazer sensorial aliado a uma combinação de funcionalidade e naturalidade, conveniência e propósito. É a era das fórmulas clean label, dos ingredientes rastreáveis, dos perfis nutricionais otimizados e das propostas que vão além do rótulo, ou seja, alimentos que se alinham com valores como bem-estar pessoal e saúde preventiva.
Em paralelo, o avanço das pesquisas sobre o microbioma humano vem reformulando a própria base da nutrição, indicando que a saúde começa, literalmente, no intestino. As descobertas nesse campo têm gerado um novo olhar para ingredientes capazes de dialogar com essa complexidade fisiológica, e é nesse ponto que as fibras alimentares assumem o seu papel de destaque.
Comumente conhecidas por seus benefícios para o intestino e por seu apelo saudável em rótulos, as fibras são vistas como ingredientes multifuncionais, capazes de agregar valor nutricional, funcional e tecnológico a uma ampla gama de produtos. Na prática, isso significa que não apenas respondem à demanda por rótulos mais saudáveis, mas também ajudam a viabilizar formulações mais limpas, estáveis e sensorialmente aceitáveis.
Nesse novo paradigma, se tornaram peças-chave de um sistema alimentar que atende às necessidades de saúde pública, como o controle do diabetes e da obesidade; que ajuda a reduzir o uso de aditivos artificiais, favorecendo a valorização de ingredientes de origem natural; e que possibilita que produtos tradicionais se reinventem sob a ótica da nutrição.
Na alimentação moderna, mais do que ingredientes funcionais, as fibras são um elo entre inovação, ciência e propósito.
No radar das tendências
Seja pela demanda crescente por produtos com benefícios funcionais, pela busca por soluções clean label ou pela valorização da saúde intestinal, as fibras ganham cada vez mais destaque como ferramentas versáteis e alinhadas às principais tendências globais.
Os números confirmam a força desse movimento. De acordo com a Mordor Intelligence, o mercado global de fibras alimentares foi avaliado em US$ 10,9 bilhões em 2023 e deve atingir US$ 16,5 bilhões até 2028, com uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 8,5%. A expansão é impulsionada por múltiplos fatores, como aumento da prevalência de distúrbios digestivos, ampliação do conhecimento sobre o microbioma intestinal, popularização das dietas plant-based e maior interesse por soluções naturais para controle de peso, saciedade e saúde metabólica.
A versatilidade das fibras é evidenciada nas categorias de produtos em que são aplicadas. Dados da Mordor Intelligence indicam que os principais mercados de aplicação global das fibras em 2023 foram panificação e confeitaria (34%), bebidas funcionais (21%), produtos lácteos e análogos (16%), cereais e snacks (14%), suplementos alimentares (9%) e carnes processadas ou alternativas (6%).
Esses números mostram que as fibras estão inseridas em diferentes formatos e momentos de consumo, do café da manhã ao pós-treino, da panificação a alimentos plant-based, participando tanto de produtos indulgentes quanto funcionais.
Nos últimos anos, também tem sido observado crescimento expressivo na demanda por tipos específicos de fibras com propriedades funcionais, impulsionado pela busca por produtos com benefícios à saúde intestinal, imunidade e equilíbrio metabólico. Entre essas fibras, a inulina se destaca como a mais utilizada, representando aproximadamente 26,3% do mercado global de fibras prebióticas em 2023, segundo dados da Custom Market Insights. Extraída principalmente da raiz de chicória, é amplamente valorizada por sua capacidade de atuar como fibra solúvel e prebiótica, além de contribuir para a redução de açúcar e gordura em diversas formulações.
Outro grupo em expansão são os frutooligossacarídeos (FOS), que vêm ganhando espaço especialmente em categorias como fórmulas infantis, bebidas funcionais e suplementos alimentares. A Future Market Insights prevê que o mercado global de FOS deve alcançar US$ 3,5 bilhões até 2030, com uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 9,5% entre 2023 e 2030.
Já os galactooligossacarídeos (GOS), também com forte perfil prebiótico, têm apresentado crescimento acelerado, impulsionado, sobretudo, por sua aplicação em nutrição infantil e produtos lácteos. As projeções da Future Market Insights indicam que o mercado global de GOS crescerá a uma CAGR de 10,2% ao ano, devendo atingir US$ 1,2 bilhão até o final da década.
Na América Latina, a demanda por ingredientes funcionais também segue em ritmo acelerado. Segundo a Euromonitor International, o mercado de alimentos e bebidas com alegações de alto teor de fibras cresceu 22% entre 2018 e 2023 na região.
Nesse mesmo ano, a Grand View Research indica que o mercado latino-americano de fibras alimentares gerou uma receita de aproximadamente US$ 672,8 milhões, com projeção de crescimento a uma CAGR de 9,6% entre 2024 e 2030. Cereais e grãos representaram a maior parcela dessa receita, com o segmento de nozes e sementes projetado como o mais promissor, registrando o crescimento mais rápido.
Além disso, dados da Mordor Intelligence mostram que o mercado de fibras dietéticas insolúveis na América do Sul também apresenta perspectivas positivas, com uma CAGR estimada em 9,3% entre 2020 e 2025.
O Brasil se destaca como um dos principais mercados nessa região. Em 2023, foi avaliado em US$ 240,5 milhões, com expectativa de alcançar US$ 479,9 milhões até 2030, com uma CAGR de 10,4% no período de 2024 a 2030, de acordo com a Grand View Research, que destaca ainda, as perspectivas positivas para o mercado de fibras e carboidratos especiais, categoria que gerou uma receita de US$ 362,8 milhões em 2024, com expectativa de atingir US$ 508,1 milhões até 2030, com uma CAGR de 5,8% de 2025 a 2030. As frutas são consideradas a fonte mais promissora, registrando o crescimento mais rápido no período projetado.
De acordo com levantamento da Mintel GNPD, os produtos com apelo de saudabilidade representam atualmente mais de 40% dos lançamentos na categoria de alimentos industrializados. Entre os ingredientes que mais crescem nos rótulos estão inulina, fibra de acácia e polidextrose, todas com aplicações versáteis, alto grau de tolerância digestiva e funcionalidade tecnológica adicional.
Globalmente, uma pesquisa da FMCG Gurus mostra que 74% dos consumidores acreditam que alimentos com fibras contribuem para a prevenção de doenças no longo prazo, o que reforça a sua relevância como ingrediente funcional com apelo transversal.
Tipos, fontes e aplicações
De cereais e pães a bebidas e snacks, as fibras alimentares estão cada vez mais no centro das formulações na indústria de alimentos e bebidas, impulsionadas por uma demanda crescente por produtos que aliam saúde, funcionalidade e sustentabilidade.
No universo das fibras, as solúveis continuam ganhando destaque por seu papel essencial na promoção da saúde digestiva e cardiovascular. Quando dissolvidas em água, formam uma substância viscosa que ajuda a reduzir os níveis de colesterol, estabilizar a glicemia e melhorar o trânsito intestinal.
Ingredientes como a inulina, extraída principalmente da raiz de chicória, são amplamente utilizados por suas propriedades prebióticas, favorecendo o crescimento de bactérias benéficas no intestino e contribuindo para o equilíbrio do microbioma.
Já a pectina, tradicionalmente obtida de frutas como maçãs e laranjas, é conhecida por suas propriedades gelificantes, mas sua atuação vai além da textura: também auxilia no controle da glicemia pós-prandial e na redução dos níveis de colesterol LDL, além de ser fermentada no cólon, gerando ácidos graxos de cadeia curta com efeitos benéficos à microbiota intestinal.
As gomas guar e xantana, amplamente utilizadas como espessantes e estabilizantes em molhos, sopas e bebidas, também oferecem vantagens nutricionais. A goma guar, por exemplo, contribui para a saciedade e o controle glicêmico ao formar géis viscosos que retardam a absorção de carboidratos. Já a goma xantana, além de melhorar a textura e estabilidade de formulações, tem mostrado efeitos positivos na redução do índice glicêmico de certos alimentos e pode atuar como suporte à função intestinal.
As aplicações dessas fibras solúveis vão além dos benefícios funcionais. Em iogurtes, bebidas probióticas e suplementos alimentares, a inulina aparece como aliada da saúde intestinal. Já a pectina é uma solução eficaz para substituir o açúcar em confeitos e produtos de gelificação, mantendo a textura e a doçura desejadas sem comprometer o valor nutricional. As gomas guar e xantana são protagonistas em soluções para bebidas e molhos com viscosidade equilibrada e rotulagem mais limpa.
Do outro lado desse espectro funcional, as fibras insolúveis seguem sendo essenciais para a saúde intestinal. Não se dissolvem em água, mas atuam mecanicamente no organismo, aumentando o volume fecal e estimulando os movimentos intestinais, além de estarem associadas à prevenção de doenças, como o câncer colorretal.
A celulose, extraída de vegetais e cascas de grãos, além de contribuir para a estrutura dos alimentos, tem ação mecânica no intestino, estimulando os movimentos peristálticos e favorecendo a eliminação de toxinas. Também está associada à melhora da microbiota, por atuar como substrato para fermentação de bactérias específicas.
A hemicelulose, por sua vez, também proveniente de grãos e vegetais, apresenta benefícios semelhantes. Frequentemente incorporada em pães e cereais, atua na regularização do trânsito intestinal e na manutenção de um ambiente intestinal saudável.
A evolução do setor, no entanto, vai além da dicotomia entre fibras solúveis e insolúveis. As chamadas fibras funcionais representam uma nova fronteira no desenvolvimento de produtos voltados para a nutrição personalizada.
Ingredientes como o psyllium, uma fibra altamente higroscópica obtida das sementes da planta Plantago, têm sido incorporados a bebidas funcionais e suplementos com foco na redução do colesterol e na regulação do trânsito intestinal.
Outro destaque é o amido resistente, presente naturalmente em alimentos como bananas verdes, batatas e leguminosas. Atuando como fibra, modula a glicemia e favorece a saciedade, sendo cada vez mais utilizado em barras, snacks low carb e outras formulações voltadas ao controle de peso e à saúde metabólica.
Em paralelo, o avanço das fibras derivadas de fontes sustentáveis reflete uma tendência que une inovação tecnológica e responsabilidade ambiental. Um exemplo são as algas marinhas, que estão despontando como ingredientes estratégicos, ricas em fibras solúveis com ação prebiótica e com grande apelo em mercados que valorizam ingredientes naturais e sustentáveis.
Essas novas fontes estão sendo aplicadas em smoothies, suplementos, snacks funcionais e barras enriquecidas, atendendo o consumidor moderno que busca propósito aliado a sabor.
Indo além da função digestiva
Durante décadas, as fibras alimentares foram associadas quase exclusivamente ao bom funcionamento do intestino. Essa percepção, embora verdadeira, se tornou limitada diante da crescente evidência científica sobre os benefícios mais amplos e sofisticados que esse grupo de ingredientes pode oferecer à saúde. Hoje, ocupam um espaço estratégico na inovação de alimentos e bebidas, impulsionadas por uma demanda que vai muito além da função digestiva.
Pesquisas recentes demonstram que determinadas fibras, especialmente as solúveis e fermentáveis, desempenham papel essencial na modulação da microbiota intestinal, o que, por sua vez, impacta diretamente a saúde metabólica, imunológica e, até mesmo, mental.
Essa conexão entre intestino e cérebro, amplamente explorada nos estudos do eixo intestino-cérebro, tem incentivado o desenvolvimento de produtos com apelo funcional voltado ao bem-estar emocional, ao controle glicêmico e à redução de marcadores inflamatórios. Ingredientes como inulina, polidextrose, galactooligossacarídeos (GOS) e fibras de aveia têm ganhado espaço em formulações destinadas a esses fins.
A modulação da microbiota intestinal por meio do consumo regular dessas fibras estimula o crescimento de cepas benéficas, como as dos gêneros Bifidobacterium e Lactobacillus, que fermentam os substratos não digeríveis produzindo ácidos graxos de cadeia curta, como acetato, propionato e butirato.
Esses compostos, além de nutrirem as células do cólon, exercem efeitos sistêmicos com potencial anti-inflamatório e imunomodulador. O butirato, por exemplo, tem sido associado à integridade da barreira intestinal, enquanto o propionato atua na sinalização de saciedade e na regulação do metabolismo lipídico e glicêmico. Esse efeito em cascata sobre o organismo amplia significativamente o valor funcional das fibras fermentáveis.
No contexto do eixo intestino-cérebro, a produção de ácidos graxos de cadeia curta e a sinalização via nervo vago contribuem para a síntese de neurotransmissores, como a serotonina, impactando positivamente o humor e o bem-estar emocional.
A inulina é um dos ingredientes mais estudados nesse campo, mostrando resultados promissores em ensaios clínicos voltados à saúde emocional e metabólica. Já os galactooligossacarídeos, além de promoverem o crescimento de Bifidobacterium, têm sido investigados por seus efeitos ansiolíticos em estudos pré-clínicos e clínicos, sinalizando um potencial ainda maior para formulações focadas em saúde mental. A polidextrose, por sua vez, oferece benefícios que vão além da modulação da microbiota. Com perfil tecnológico favorável, como baixa viscosidade, resistência ao calor e sabor neutro, tem sido aplicada com sucesso em alimentos e bebidas com apelo funcional e baixo teor calórico, contribuindo também para a saciedade e o controle glicêmico.
Essa nova fronteira da nutrição tem ganhado espaço especialmente nas categorias de bebidas funcionais, como águas prebióticas, smoothies e leites vegetais, onde a adição de fibras, como a goma guar e a pectina, tem possibilitado o enriquecimento nutricional sem comprometer o sabor.
A versatilidade das fibras também se reflete em aplicações que vão desde produtos refrigerados e congelados até suplementos e shots funcionais, entregando doses convenientes de fibras com benefícios digestivos e metabólicos.
O segmento de snacks, por sua vez, também vem sendo reinventado pela incorporação inteligente de fibras. Barras de cereais com inulina ou polidextrose, chips enriquecidos com fibras vegetais e bolachas com fibras mistas, oferecem não apenas maior saciedade, mas também um perfil nutricional diferenciado. A combinação equilibrada entre fibras solúveis e insolúveis nesses produtos permite ao consumidor obter benefícios como o controle do apetite, melhoria do trânsito intestinal e suporte à saúde imunológica, sem abrir mão da indulgência.
Esses avanços abrem caminho para uma nova geração de alimentos e bebidas que associam funcionalidade digestiva e bem-estar sistêmico. Bebidas fermentadas, suplementos em pó, snacks com apelo emocional e produtos plant-based enriquecidos com fibras funcionais, estão entre as categorias mais promissoras.
A formulação e reformulação de produtos com foco na saúde mental e no equilíbrio do microbioma é uma resposta direta a um consumidor que busca soluções integradas e personalizadas para o seu estilo de vida.
Fibras que nutrem o microbioma e promovem o bem-estar integral
Na alimentação moderna, as fibras ganham protagonismo não só pela contribuição à regularidade intestinal, mas também pelos efeitos positivos sobre a saúde metabólica e o bem-estar geral. Um exemplo são as fibras de raiz de chicória Orafti® Inulina e Oligofrutose, da BENEO, prebióticos naturais que estimulam bactérias benéficas, auxiliam na digestão, aumentam a absorção de nutrientes e fortalecem a imunidade, com benefícios cientificamente comprovados.

Cesar Manso, Country Manager Brazil da BENEO
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