Com o aumento do interesse pela prática de atividade física e da busca por um padrão de vida saudável, tem crescido também no Brasil o consumo de produtos alimentícios ultraprocessados com alegações de proteína, como “paçocas proteicas”, “sopas proteicas”, “tapiocas proteicas”, entre outros. Isso porque muitas pessoas acreditam que só vão evoluir na prática de exercícios suplementando esse nutriente – o que não é verdade.
Por isso, o Idec (Instituto de Defesa de Consumidores) divulgou um levantamento que busca entender se as alegações de proteína adicionada em produtos ultraprocessados comercializados no Brasil estão alinhadas com as normas nacionais vigentes e com os princípios do Guia Alimentar para a População Brasileira.
Foram identificados 60 produtos, dos quais 52 atenderam aos três seguintes critérios: 1) apresentar alegação de proteína no rótulo; 2) ser classificado como ultraprocessado pela classificação Nova de alimentos; e 3) declarar o ingrediente responsável pela fortificação proteica entre os cinco primeiros da lista de ingredientes.
Nos 52 produtos, foram encontradas 65 alegações relacionadas a proteína. Os resultados demonstraram que a maioria dessas alegações são referentes a quantidade (44 delas) e que as presentes em 11 produtos podem induzir os consumidores ao erro. Além disso, observou-se que alimentos que antes eram minimamente processados ou processados tornaram-se ultraprocessados apenas para atender à tendência de fortificação proteica, contrariando os princípios do Guia Alimentar.
Assim, o instituto conclui que as alegações referentes ao conteúdo de proteína nos rótulos, em geral (mas de forma mais preocupante nos ultraprocessados), podem induzir o consumidor a acreditar que estará fazendo uma escolha alimentar mais saudável, uma vez que a informação declarada pode promover essa categoria de produtos e trazer um apelo de saudabilidade. Para o Idec essa estratégia é preocupante por três aspectos principais: 1) pode estimular a troca de um alimento saudável por um produto ultraprocessado; 2) pode incentivar o consumo de um ultraprocessado; e 3) pode induzir a pessoa consumidora a acreditar que está consumindo uma quantidade de proteína diferente da real.
Além disso, o instituto destaca que a adição de nutrientes considerados saudáveis (como as proteínas), em produtos ultraprocessados, não garante os mesmos benefícios nutricionais que o consumo desses nutrientes em alimentos in natura ou minimamente processados. A fortificação de ultraprocessados com ingredientes que contém proteínas, como o whey protein e o soro de leite, por exemplo, não pode ser comparada ao consumo de fontes naturais de proteína, como leguminosas, ovos ou carnes, que apresentam interações complexas entre nutrientes, fibras e compostos bioativos.
O Idec conclui que as alegações de proteína em ultraprocessados podem comprometer a escolha consciente dos consumidores, reforçando um apelo de saudabilidade nem sempre real. O instituto recomenda, ainda, maior fiscalização por parte dos órgãos reguladores, e que os consumidores façam uma leitura crítica dos rótulos, considerando, principalmente, a lista de ingredientes e o nível de processamento.
É necessário suplementar proteína?
Na maior parte dos casos, não. Órgãos internacionais, como a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), recomendam uma ingestão diária entre 0,6 g a 0,8 g de proteína por quilo de peso corporal, porém, o que se observa é uma promoção de ingestão muito superior. A ingestão de proteínas na América do Sul, em 2022, era, em média, de 96,4 g por pessoa.
Porém, ainda assim, devido à busca por praticidade, desempenho físico e conveniência alimentar, tem-se visto no mercado a “snackficação” das refeições (ou seja, a substituição de refeições completas por lanches prontos, com foco em nutrientes isolados e alegações funcionais).
Essa prática nem sempre é saudável, pois, na maioria das vezes, se baseia em ultraprocessados, que são associados ao aumento de doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade, diabetes, hipertensão, entre outras, na população mundial.
“A adição de proteína nessa categoria de produtos não representa benefícios reais devido à sua composição, trazendo, na verdade, potenciais malefícios. Os alimentos in natura ou minimamente processados, como os diferentes tipos de feijão, a lentilha, os ovos, o leite e seus derivados, são mais benéficos por oferecerem qualidade nutricional sem os prejuízos do ultraprocessamento. Ao mesmo tempo que os ultraprocessados proteicos são exaltados, os alimentos tradicionais, culturais e acessíveis têm sido desvalorizados no imaginário social”, alerta Mariana Ribeiro, nutricionista do programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Idec.
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