Personalização nutricional: otimizando saúde, desempenho e bem-estar

Caracterizada por uma abordagem que alinha a composição nutricional de um produto às características específicas de um indivíduo ou grupos, a personalização nutricional vem redefinindo o modo como os alimentos e bebidas são formulados, desenvolvidos e consumidos.
Por Márcia Fani
Em um cenário em que saúde, bem-estar e escolhas conscientes orientam o comportamento de consumo, cresce a demanda por alimentos que vão além do funcional para entregarem benefícios sob medida, com foco em objetivos específicos, seja para otimizar a digestão, melhorar o desempenho cognitivo, modular a imunidade ou manter níveis adequados de energia ao longo do dia.
É nesse contexto que a personalização nutricional surge como uma abordagem estratégica para atender às necessidades específicas dos consumidores contemporâneos, ou seja, entregar produtos moldados para indivíduos com necessidades, rotinas e biotipos distintos.
Se antes o desafio era atender grandes massas com formulações padronizadas, hoje a demanda está na capacidade de oferecer produtos ajustados às necessidades individuais, respeitando preferências alimentares, estilo de vida, objetivos metabólicos e, inclusive, perfil genético ou microbioma.
Nesse novo paradigma, a personalização vai além do marketing para se conectar a megatendências globais, como saúde preventiva, bem-estar holístico, longevidade ativa e autocuidado. Dados da FMCG Gurus mostram que mais de 60% dos consumidores globais desejam produtos que respondam aos seus objetivos específicos de saúde, como ganho de energia, melhora da digestão, controle da glicemia ou fortalecimento da imunidade.
Essa movimentação impulsiona a indústria a buscar modelos de formulação mais flexíveis, ingredientes funcionais mais precisos e novas tecnologias, que permitam adaptar a nutrição às demandas individuais ou de grupos com características semelhantes.
Movido por um consumidor cada vez mais consciente, exigente e conectado aos próprios objetivos de saúde, a personalização nutricional se torna uma estratégia relevante no desenvolvimento de produtos alimentícios e bebidas contemporâneas, convidando a indústria a acompanhar essa mudança com inovação e visão estratégica.
Ganhando escala
No cenário global, o mercado de personalização nutricional apresenta crescimento acelerado. Em 2024, movimentou cerca de US$ 14,14 bilhões, com projeções indicando que pode atingir aproximadamente US$ 65,15 bilhões até 2033, o que representa uma taxa composta anual de crescimento (CAGR) de 17,2% entre 2025 e 2033, conforme dados da IMARC Group.
Já de acordo com a Precedence Research, o mercado global deve alcançar US$ 17,9 bilhões em 2025, crescendo a uma CAGR anual de 14,63%, podendo atingir US$ 60,94 bilhões até 2034. Essa convergência de estimativas reforça o vigor do setor, à medida que saúde e bem-estar são incorporadas ao desenvolvimento de produtos personalizados.
No Brasil, embora ainda em estágio inicial comparado a mercados mais maduros, essa abordagem vem ganhando tração. Segundo dados da Grand View Research, o mercado brasileiro de nutrição personalizada e suplementos alimentares foi avaliado em US$ 216,9 milhões em 2024, com projeção para atingir US$ 311,0 milhões até 2030, crescendo a uma CAGR de 6,1% entre 2025 e 2030.
Essa expansão reflete um ambiente favorável, onde os consumidores buscam produtos que atendam às suas necessidades específicas e restrições alimentares, ao mesmo tempo em que esperam conveniência e qualidade.
Estudos da Mintel mostram que 72% dos consumidores globais valorizam produtos que oferecem benefícios específicos para seu estilo de vida e condição de saúde, o que impulsiona esse crescimento e reforça a demanda por inovação em personalização.
Com relação à distribuição das categorias, dados da Innova Market Insights apontam que os suplementos nutricionais lideram o mercado global de personalização, respondendo por aproximadamente 45% a 50% do valor total do mercado, dada a facilidade de formulação e adoção para públicos-alvo específicos, como imunidade, performance esportiva e saúde digestiva.
Os alimentos funcionais personalizados representam cerca de 30% a 35%, com destaque para snacks, barras e misturas em pó, que oferecem benefícios direcionados, segundo a Euromonitor International.
Já as bebidas personalizadas, embora representem uma fatia menor, em torno de 15% a 20%, mostram crescimento acelerado, especialmente nas categorias de bebidas funcionais, shots vitamínicos e formulações adaptogênicas.
Com previsão de crescimento acelerado para a próxima década, tanto a nível global como Brasil, a personalização nutricional evolui cada vez mais na busca por equilíbrio entre escalabilidade, precisão e experiência sensorial para conquistar o consumidor cada vez mais exigente e conectado.
Inovação centrada no consumidor
A personalização nutricional representa um novo mindset, no qual a indústria escuta o consumidor, interpreta dados reais de saúde e entrega valor tangível.
Com o avanço de tecnologias como sequenciamento genético, análise do microbioma e monitoramento digital de saúde, o setor de alimentos e bebidas passa a ter acesso a informações mais granulares e personalizadas, o que abre caminho para o desenvolvimento de produtos nutricionalmente precisos, que entreguem benefícios mensuráveis e perceptíveis.
Nessa nova lógica, a inovação parte da interseção entre ciência de dados, biotecnologia, neurociência sensorial e, sobretudo, escuta ativa do consumidor, refletindo a evolução do próprio comportamento de consumo.
Para a indústria, isso significa migrar de uma lógica de produto para uma lógica de ecossistema, onde alimentos, suplementos, plataformas digitais e experiências sensoriais se conectam para entregar uma nutrição sob medida. Seja no formato de bebidas funcionais que se adaptam ao ritmo do consumidor, snacks que respondem às necessidades do dia ou suplementos que acompanham planos nutricionais individualizados, a personalização está diretamente relacionada ao desejo do consumidor contemporâneo por controle, relevância e inovação.
O desafio está em combinar escala, precisão, saudabilidade e sensorialidade em soluções que sejam eficazes, seguras, acessíveis e, acima de tudo, desejadas. O sabor, a textura, o formato e até o ritual de consumo continuam sendo decisivos para a adesão. Por isso, a personalização também exige criatividade em design sensorial e entrega de conveniência, criando experiências que promovam o cuidado pessoal de forma prazerosa, intuitiva e conectada ao estilo de vida.
Ingredientes sob medida
A personalização nutricional passa, necessariamente, pelo domínio da ciência dos ingredientes e, cada vez mais, a indústria investe na criação de uma nova geração capaz de atender necessidades específicas de diferentes perfis fisiológicos, comportamentais e até genéticos.
O desenvolvimento de proteínas ajustadas ao perfil e às metas do consumidor é um dos pilares da personalização. Para o consumidor que busca saciedade, proteínas com liberação lenta e alto índice de aminoácidos essenciais favorecem o controle do apetite e o gerenciamento do peso. Já atletas e consumidores ativos demandam proteínas otimizadas para síntese muscular, com destaque para frações isoladas de whey, caseína, soja, ervilha e arroz, além de blends que combinam perfis anabólicos e digestivos. Para consumidores com sensibilidade gastrointestinal, surgem versões com digestão leve, hidrolisadas ou associadas a enzimas, que reduzem desconfortos e maximizam a absorção. Esses ingredientes encontram aplicações personalizadas em suplementos proteicos, shakes prontos para beber, fórmulas em pó para nutrição esportiva e bebidas funcionais.
Com a saúde intestinal sendo cada vez mais reconhecida como central para o bem-estar sistêmico, ingredientes como inulina, frutooligossacarídeos (FOS), galactooligossacarídeos (GOS) e polidextrose, funcionam como combustível seletivo para bactérias benéficas, estimulando a diversidade e o equilíbrio do microbioma. Esses ingredientes são especialmente relevantes em produtos como iogurtes, bebidas vegetais fermentadas, suplementos em pó, barras funcionais e sobremesas com apelo digestivo.
A inovação está na personalização desses ativos de acordo com biotipos intestinais específicos, com base em análises de microbioma, o que permite soluções sob medida para condições como disbiose, constipação, metabolismo lento ou imunidade enfraquecida. Além disso, novas fibras estão surgindo com funcionalidades adicionais, como melhora do índice glicêmico ou efeito texturizante em formulações clean label.
Já com foco no bem-estar holístico, ingredientes com atuação no eixo mente-corpo ganham protagonismo. Os peptídeos bioativos, derivados da quebra controlada de proteínas, têm mostrado efeitos em áreas como pressão arterial, saciedade, relaxamento e resposta inflamatória. Já os adaptógenos, como ashwagandha, Rhodiola e ginseng, são reconhecidos por seu potencial de modular o estresse, aumentar a resistência física e mental e restaurar o equilíbrio. Extratos botânicos como camomila, lavanda, cúrcuma, chá-verde, maracujá e bacopa monnieri são cada vez mais usados por suas propriedades relacionadas ao sono, foco, cognição, humor e recuperação. A microencapsulação tem sido decisiva para preservar a estabilidade e mascarar sabores amargos, viabilizando a aplicação desses ingredientes em bebidas, balas funcionais, snacks e cápsulas mastigáveis.
A personalização também avança em micronutrientes, com a oferta de pré-misturas sob medida, que atendem diferentes consumidores, desde gestantes, crianças e idosos até atletas e pessoas com restrições alimentares. A modularidade permite combinar formatos (microencapsulados, quelados, lipossomais) e objetivos (imunidade, energia, beleza, saúde óssea, função cognitiva). Além disso, essas soluções já são pensadas para aplicações técnicas específicas, como estabilidade em bebidas ácidas, resistência ao calor em panificação ou compatibilidade com ingredientes ativos sensíveis. Suplementos nutricionais, bebidas esportivas, alimentos infantis, produtos plant-based e produtos para nutrição sênior são algumas das categorias que mais se beneficiam desse tipo de solução.
Outra inovação são os compostos com ação metabólica personalizada, que atendem ao consumidor moderno na busca por nutrição aliada a performance, impulsionando ingredientes com efeitos diretos na cognição, foco, humor e energia. A L-teanina, presente no chá-verde, por exemplo, promove relaxamento sem causar sonolência e é frequentemente combinada com cafeína natural, criando uma sinergia que aumenta o estado de alerta sem provocar excesso de estimulação. Colina e tirosina são precursores de neurotransmissores ligados à memória e motivação, com aplicações crescentes em fórmulas para produtividade, aprendizado e envelhecimento saudável. Já os nootrópicos naturais, como ginkgo biloba, bacopa e fosfatidilserina, estão ganhando espaço em suplementos, shots e alimentos funcionais com apelo mental clarity. A escolha da forma, dose e combinação depende da meta desejada: energia sustentada, foco agudo, calma ativa ou resiliência mental.
É importante lembrar que nessa nova geração de alimentos e bebidas personalizados, o efeito funcional precisa andar de mãos dadas com a experiência sensorial. Afinal, de nada adianta um produto prometer foco, energia ou saciedade se não entregar prazer ao paladar, textura agradável e um ritual de consumo que se encaixe no estilo de vida do consumidor. Ingredientes sob medida, desenvolvidos para impactar a saúde de forma personalizada, também estão redefinindo o conceito de sensorialidade, trazendo soluções mais inteligentes, sutis e integradas.
Nesse contexto, a própria escolha dos ingredientes influencia diretamente a percepção sensorial. Peptídeos bioativos podem contribuir para notas umami sutis, que aumentam a complexidade do sabor e a sensação de saciedade; fibras solúveis, como inulina e polidextrose, também funcionam como agentes texturizantes, oferecendo cremosidade e corpo a bebidas e sobremesas com baixo teor de gordura ou açúcar; extratos botânicos e nootrópicos naturais, quando bem equilibrados, agregam notas herbais, florais ou cítricas que enriquecem a assinatura sensorial do produto; proteínas vegetais vêm sendo refinadas para reduzir off-flavors e alcançar perfis mais neutros, abrindo espaço para sabores sofisticados ou indulgentes em aplicações doces e salgadas.
Mais do que funcionalidade, o consumidor espera uma experiência completa, em que nutrição, bem-estar e prazer se convergem, o que inclui também aspectos como cor natural, espessura ideal, carbonatação equilibrada, retrogosto limpo e, inclusive, o som de crocância. Sensações táteis, auditivas e olfativas ganham protagonismo ao lado dos benefícios prometidos no rótulo.
A personalização nutricional não se limita a “o que consumir”, mas também a como consumir, tornando o cuidado com a saúde um hábito desejável, acessível e prazeroso.
Nutrição no momento certo e com o ingrediente estratégico
Cada vez mais os consumidores procuram bebidas populares e convenientes que entreguem o impulso nutritivo de que precisam, no momento certo. Nesse contexto, um dos nutrientes mais valorizados é a proteína, especialmente entre aqueles que adotam um estilo de vida ativo e saudável.

Ignacio Estevez, Application Manager, South America, da Arla Foods Ingredients
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